Nem tudo que reluz é ouro: discutindo prevenção quaternária a partir de ditados populares

Autores

DOI:

https://doi.org/10.5712/rbmfc14(41)1781

Palavras-chave:

Aforismos e Provérbios como Assunto, Medicina de Família e Comunidade, Prevenção Quaternária, Competência Cultural, Medicalização

Resumo

A Medicina tem convocado as pessoas a realizarem cada vez mais ações preventivas, desde medidas de pressão arterial até a aplicação de novas vacinas; entretanto, médicas e médicos de família e comunidade têm identificado riscos e limitações das ações preventivas, mostrando que nem todas elas são ética ou cientificamente justificáveis. Esse é o escopo da prevenção quaternária, que visa poupar as pessoas de sobremedicalização e procedimentos desnecessários. Vivendo em uma sociedade que prima pela alta tecnologia, onde o terror virou negócio e o autocuidado, uma obsessão, pode ser muito difícil desaconselhar a realização de algum exame ou desprescrever alguma medicação; porém, é exatamente nesse contexto que a prevenção quaternária é profundamente necessária, e a dificuldade de sua prática exige articular outros saberes e recursos além do nível de evidência ou do grau de recomendação de uma ou outra ação. As crenças em saúde são objeto de um cuidado centrado na pessoa, e muitas delas são inspiradas ou traduzidas por ditados populares. Nesse ensaio, discuto o excesso de intervenções e a prevenção quaternária a partir de alguns deles. Analisando frases como “é melhor prevenir do que remediar”, apresento os aforismos como ferramentas de compreensão da prevenção quaternária, podendo ser usados por profissionais e docentes para discutir essa prática contra-hegemônica com pacientes e estudantes. Ao articular os saberes popular e profissional, o texto contribui à competência cultural da Atenção Primária à Saúde e ajuda a produzir encontros clínicos mais harmoniosos e a promover um cuidado menos invasivo, medicalizador e danoso.

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Biografia do Autor

Antônio Augusto Dall'Agnol Modesto, Faculdade de Medicina da Universidade Cidade de São Paulo (Unicid)

Médico de Família e Comunidade e Doutor em Medicina Preventiva pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Professor de Atenção Primária à Saúde na Universidade Cidade de São Paulo (Unicid).

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Publicado

2019-03-06

Como Citar

1.
Modesto AAD. Nem tudo que reluz é ouro: discutindo prevenção quaternária a partir de ditados populares. Rev Bras Med Fam Comunidade [Internet]. 6º de março de 2019 [citado 19º de março de 2024];14(41):1781. Disponível em: https://rbmfc.org.br/rbmfc/article/view/1781

Edição

Seção

Artigos de Pesquisa

Plaudit